ADQUIRA MEU NOVO LIVRO!

Compre aqui o livro 'A Menina que nasceu Poesia'

sexta-feira, 24 de outubro de 2014

A Logística da Empatia

Como as relações humanas nos afetam, mesmo que não assumamos isso. 

Conheça e Dona Jeripoca. Dona Jeripoca é uma senhora de 58 anos que mora lá no Semi-árido. Dona Jeripoca sustenta 4 filhos e 5 netos. A família trabalha no roçado, que ora vinga, ora mirra.
Dona Jeripoca é beneficiada pelo Bolsa-Família, e com este programa ela garante o mínimo para subsistência dela e dos seus.
Com o dinheiro do Programa, Dona Jeripoca vai ao armazém do Seu. Tércio. Compra farinha , ovos, algumas batatas e feijão.
Seu Tércio conhece Dona Jeripoca desde sempre. Brincaram de bilboquê juntos. Até trocaram selinhos atrás da Igreja de São José Operário. O Padre Lúcio via e fazia vista grossa. Coisa de criança. Por conhecer Dona Jeripoca, Seu Tércio a deixa "pendurar a conta" muitas vezes, anotando os gastos em seu velho caderninho Tilibra.
Padre Lúcio, todo orgulhoso da reforma da igreja, fica horas e horas alisando o confessionário com lustra móveis. Nem deixa as irmãs fazerem o serviço. Ele, pessoalmente, trata daquele confessionário.
Dona Jeripoca às vezes vai lá se confessar: - Seu Padre, às vezes eu atraso o pagamento do Armazém e fico mal com isso, porque abuso da confiança do Seu Tércio. Mas é só alguns dias, ele nem chega a cobrar. Eu é que não gosto.
Dona Jeripoca é muito certa com as coisas. Não gosta de nada que não é seu. Foi então rezar suas Ave-Marias e ver um pouco de TV pra esfriar a cabeça. Entre uma notícia e outra, viu uma propaganda de material escolar: Cadernos Tilibra, 15,99.
Chamou o neto caçula, o Demizinho (carinhoso apelido para Ademir) e lembrou de cobrá-lo sobre a lição de casa, se ele já havia feito. O moleque fez que não com a cabeça e já ia saindo quando ela, num olhar, o paralisou: - Num estude pra tu vê! Vai ficar com as mãos assim, ó! - e mostrou os calos vindo do cabo da enxada. Madeira boa.
O menino correu pro quarto.
Aqui no Sudeste, Luis fora promovido. De auxiliar administrativo para supervisor. Estudou feito doido, mereceu a promoção. Ele trabalha na Tilibra, indústria e comércio de material de escritório, escolar etc. Seu Almeida já vinha acompanhando o desempenho do jovem, e deu a notícia no dia do aniversário de Luis: - Quero que saiba que você mereceu essa promoção! É pró-ativo, dinâmico...
Sem ter o que dizer, Luis apenas agradeceu com um aperto de mão e correu para o banheiro. Chorar. Chorou as noites mal-dormidas, os lazeres que se furtou, o desdém de pseudos-amigos e parentes. Sabia que podia ir mais longe, porque sua ambição era saudável.
Luis era amigo bem próximo de Bianca, Gerente de Vendas da Tilibra, e foi logo contar a ela a boa notícia: - Consegui! - disse ele, suspirando.
Bianca sorriu com o olhar e disse: - Eu já sabia, antes de você. Seu Almeida me contou numa viagem que fizemos a negócios numa feira no Nordeste. Disse que estava te sondando. Não contei nada para não estragar a surpresa.
- Olha você, com segredinhos comigo!? - brincou Luis.
A Feira rendeu novos negócios à empresa, que gerou aumento nas vendas, que gerou ânimo em Seu Almeida, que gerou a promoção de Luis. Um dos negócios fechados foi a Distribuição de Promotores de Vendas no Semiárido. Seu Tércio expôs alguns cadernos e ganhou uma agendinha. A agendinha onde ele marca as penduras de Dona Jeripoca. Mal sabe Dona Jeripoca, mas ela promoveu Luis, que sonha agora em viajar para o Nordeste no final de ano, agora que seu salário aumentará como Supervisor.
Brincadeiras à parte, essa história inventada diz uma coisa: sob o ponto de vista social, não existe o MEU dinheiro que sustenta OS OUTROS. Muita gente banca o que eu tenho, e eu banco a vida de muitos.
Agora pare com esse discurso elitista e enxergue o mundo além do seu quarto e seu edredom do Ben 10.
Antes que a Jeripoca pie. 
Imagem: http://www.digitalmipibu.com.br/2014_02_09_archive.html

Nenhum comentário:

Postar um comentário